No 4.º trimestre de 2019, entre as 10 maiores companhias aéreas a opera no Aeroporto da Madeira, a TAP liderava com quase 1 em cada três voos (29%), seguida da Transavia France (que faz as ligações ao Porto), com 10% e da EasyJet Europe, com 9%. Em termos do movimento de passageiros, a TAP continua líder (28%), seguida da EasyJet Europe (12%) e em 5.º no top-10 aparece a Transavia France (7%). Estes dados foram publicados pela Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) no seu mais recente >Boletim trimestral Estatístico, a 12 de Fevereiro de 2020.
As duas companhias privadas ameaçaram deixar a rota da Madeira se, nas actuais condições, entrar em vigor o subsídio de mobilidade que garante ao passageiro residente no arquipélago pagamento de apenas 86 euros para ir e voltar.
Terá mesmo de ser assim? E quais as alternativas e, caso não se concretizem nos tempos próximos, quais serão as consequências do regresso a um tempo onde havia apenas uma alternativa, a TAP? Questionamos o presidente da Delegação da Madeira da Ordem dos Economistas, que aponta vários factores para evidenciar que quem mais tem a perder serão essas empresas.
“Face à líder TAP, quer a EasyJet quer a Transavia não têm junto dos consumidores a mesma percepção de qualidade oferecida, não têm o mesmo número de voos e distribuição e horários ao longo do dia; não têm a mesma capacidade de reposição de voos nos dias de cancelamentos por causa dos ventos e no caso da EasyJet, as pessoas atribuem valor negativo ao Terminal 2 de Lisboa. Isto significa que com a fixação de um preço de €86, todos os clientes vão preferir racionalmente marcar voos TAP, afastando clientes das outras duas. Elas não se estão a afastar, estão a ser corridas. Não é intenção, mas é a consequência”, conclui Paulo Pereira.
Já quanto à segunda questão, “depois há a questão do recebimento: as companhias regulares recebem hoje em todo o mundo ou a pronto do cliente final quando este marca na internet ou a uma semana sem risco via IATA quando é por agência de viagens. Empresas estrangeiras não vão criar um sistema informático complexo, desconhecido e caro de identificação do NIF do viajante para lhe fazer preços especiais articulando com todo o seu sistema de preços, ficar com o risco de recolha de documentação toda para depois ir fazer prova ao Estado Português para poder receber a diferença”, explica. “Sem falar na má reputação do pagador Estado, se houver alguma falha ou burla de um viajante, ficará uma companhia na incerteza de receber essa parte, ou de um lote inteiro de viagens, vai litigar com o Estado para receber? Com que custos? O destino não compensa este investimento e risco, mas aqui admito que a TAP tenha outro tipo de ‘confiança’ no Cliente Estado”.
Ainda assim, o economista acredita que o melhor é “esperar mais consequências imprevistas”, sendo que “o aumento de passageiros madeirenses que se espera com menos voos deixará naturalmente menos lugares para o turismo, aumentando o preço das viagens para a Madeira (estes já não subsidiados), com impactos negativos brutais no sector e toda a restante economia regional”.

TAP numa ‘gaiola dourada’
“Thomas Sowell chamou a atenção para que quando as pessoas exigem o impossível, só mentirosos os podem satisfazer. A unanimidade parlamentar não faz a realidade deixar de ser como é: os mercados são completamente independentes das vontades de um agente económico, pois são compostos de biliões de intenções e acções individuais em constante mudança e que só em liberdade conseguem atingir uma ordem natural, espontânea e a possível face à quantidade de recursos e tecnologia disponíveis em determinado momento”, argumenta Paulo Pereira.
“Apesar de eventuais boas intenções, toda e qualquer intervenção pública nos mercados tem sempre consequências imprevistas e os subsídios são os mais atrevidos, pois desvirtuam o preço, que é a única maneira que o mercado tem para equilibrar ofertas e procuras de bens e serviços, quer se goste ou não, são limitados”, aponta ainda. Assim, se o modelo até agora em vigor já tinha trazido uma série de consequências negativas não previstas, esta nova alteração está a trazer desde já como inesperadas consequências (ignorando o factor custo para o Estado, porque esse não interessa porque é a ‘dividir por todos’)”,
Perante este cenário que “faz lembrar aqueles ‘cartoons’ humoristas do mau a dar um tiro com uma pistola com um cano comprido que dá a volta e acaba na parte de trás da sua cabeça...”, exemplifica.
Por isso, “nem a TAP quererá este ónus sozinho e já está a dar leves sinais disso, sem querer (por não poder) passar pelo mau da fita, deixando esse papel para as suas concorrentes. Por motivos de incapacidade operacional, da gestão interna do seu plano estratégico, das suas oportunidades de mercado globais que procura e de não ficar com demasiada exposição geográfica a um mercado e a um cliente (neste caso o Estado Português). É uma espécie de gaiola dourada que depois poderá não poder sair com facilidade se e quando as unanimidades parlamentares voltarem a trocar as regras para algo menos favorável para si...”, conclui.


Três notas

A rota aérea regular entre a Madeira e Lisboa representou 1,7% de todo o tráfego realizado nos aeroportos nacionais no 4.º trimestre de 2019, sendo que tanto a TAP como a EasyJet Europe colocam este trajecto entre a ilha e o continente no 6.º lugar em termos de representatividade no total de movimentos aéreos.

A mesma rota, mas em voos não regulares, estava em primeiro lugar com 3,8% da quota de mercado, sendo operada pela Swiftair, TAP, Serair Transworld Press, Privilege Style e Lease Fly Services.

No 4.º trimestre de 2019, a Transavia Europe fez 558 voos entre a Madeira e os aeroportos de Lisboa, Porto ou Berlin Tegel, sendo a única das novas companhias aéreas a começar a operar para a Madeira desde o continente, embora tenha sido uma substituição dentro do mesmo grupo´´.


O novo que não é novo
“No aeroporto do Funchal aponta-se a entrada da EasyJet Europe nas ligações regulares a Lisboa e Porto e as saídas da Germania de algumas ligações regulares a aeroportos alemães e da My Travel Airways de ligações não regulares a vários aeroportos do norte da Europa.” - Nota sobre a aposta da easyJet nesta rota ocorrida no 4.º trimestre de 2019, ANAC, Boletim Estatístico Trimestral n.º 44.
EasyJet
“A easyJet reitera uma vez mais que não conseguirá implementar as mudanças (...), implica a expulsão da easyJet de um mercado liberalizado, por uma decisão política, e que forçará a companhia a interromper as duas rotas domésticas actualmente existentes entre a Madeira e o continente português” - Reacção à aprovação na AR da revisão ao subsídio de mobilidade, comunicado da EasyJet de 6 de Fevereiro de 3030

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